Ademir Antonio Bacca - em dez Poemas

armistício

nenhum gesto
que não acariciar
teu rosto

há em mim
intenções de sossego

nenhum movimento
que não desnudar
teu corpo

há em mim
intenções de paz
apesar da palavra
engatilhada

Ademir Antonio Bacca é Poeta, escritor, contista e jornalista, atuando atualmente como produtor cultural

quase manhã...

quase manhã
e nada de ti

nem do teu cheiro

lá fora
só o ruído
de gente
que não passa.

Ademir Antonio Bacca

a nossa é...

a nossa
é paixão
mal resolvida

olhos
que se estudam
mãos
que se encontram
e lábios
que dizem não

Ademir Antonio Bacca

das águas que movem o moinho da saudade

o murmurar
das águas do rio
que corre ao longe
da minha infância
faz-se ouvir
na noite de saudades
do meu pai,
que se precipita em sombras
e silêncio

nada que não o correr
de águas mansas
que trazem lembranças
de trigais dançando ao vento
e da velha avó
resistindo ao peso dos anos

o murmurar
das águas do rio
da minha infância
atravessa a noite silenciosa,
remenda meus sonhos
de menino
e deságua no mar de saudades
que se forma nos meus olhos

Ademir Antonio Bacca

acordando de pé esquerdo

ainda hoje
bem cedo
doeu a ausência
do teu corpo
colado ao meu.

Ademir Antonio Bacca

fratura exposta

mente em pedaços,
fragmentos de lembranças
expostas no meio da noite
que não leva a nada

(e a vida escorrendo
feito copo que tomba
e desperdiça verso precioso)

Ademir Antonio Bacca

eu venho assim...

eu venho assim pela noite,
paixão incontida aflorando o peito,
água represada que não se contém,
explode
e arrasta as emoções incautas
que encontra pelo caminho.

eu venho assim meio sem jeito
pelas ruas,
vadio no meu pensar,
abandonando lembranças pelas esquinas,
sem pressa nenhuma de chegar
e não te encontrar.

Ademir Antonio Bacca

Do azul

De ti
me basta o sol
das manhãs de primavera
que me ofereces
em olhares de um azul
que não cabe no oceano
do poema.

Ademir Antonio Bacca

da triste realidade

este mesmo coração
irresponsável
que se desmantela
em batidas
por ti,
um dia vai deixar
de bater
por mim.

Ademir Antonio Bacca

das divergências

a rede
que protege
teu corpo
não te defende
dos teus medos

o movimento
que leva teu corpo
ao espaço
não ergue teu sonho
um palmo acima do chão

trapezistas e peixes
divergem sobre redes
de contenção

Ademir Antonio Bacca