Edinara Leão - em dez Poemas

Máscaras

Mágico é o instante
do encontro das
mãos
Mas tua busca é maior
queres além das mãos
queres a mim inteira

( como se eu inteira
fosse... )

Edinara Leão publicou Minhas Faces (1991), (a)MOSTRAgem (2001) e Quando sopram os trigais (2006). Tem participação em mais de 70 coletâneas literárias. Foi escolhida a Escritora do ano em 2001, 2003 e 2004. É sócia honorária da CAPORI, recebeu em 2003 a Medalha Nelson Fachinelli de incentivo à cultura. Presidiu a Casa do Poeta de São Luiz Gonzaga em 2002 e 2003. É idealizadora e fundadora do Movimento virArte, que coordena desde 21/10/2003.

Momento II

A escada. A porta.
Ninguém baterá.
Pouca palavra.
Os olhos sangram ausências.
As mãos entabulam o querer.
Caminhos aflitos do corpo.
Livros na mesa.
Rendição.
Fuga do tempo.

Ele quis demais.
Ela quis demais.

( mas havia o mundo
lá fora )

Edinara Leão

Pecado

Primeiro
ele se achegou
com uma flor na mão

depois
mexeu na casa
cortou meus cabelos
fez nossa comida

e então
tomou meu ventre
e cometemos o pecado
de amar
sem amor

Edinara Leão

Ânsia

Não sei o que quero
não sei o que queres
e falamos demais
e falamos de menos
ou nada falamos
deixamos as rédeas
de nossas ânsias,
castradas pelo tempo
e distância
de mãos,
falarem
sem a teia das palavras
na rede da energia
na polaridade do alumbramento
de tuas águas

não te vislumbro amanhã
sinto teu corpo
sobre o meu
hoje
apenas...

Edinara Leão

Rio & tempo

funéreo o penhasco
suja a água
sem o dom original,
desacompanhada do leito
já sem curso

mas as gentes sorriam e
falavam
olhando o estranho rio,
com dobras no curso
longe do leito

no escuro do rio
– as dores das gentes
escuras também
em seu parco viver.

Edinara Leão

Desenredo

do corpo
que desconheço
cela nua
nunca vista

imagino um desenredo
em curvilínio
universo

na ponta dos dedos
teço mapas
para minha ânsia
acalmar

e nessas estradas
que vou
- viajante
sem destino -
aplaco tuas
montanhas
e perco-me no
teu mar

Edinara Leão

Imagens quebradas

sombras de baile dançando ao vento
eterna onda de amenos mares
perdidos encontros no véu do presente

vida que vibra
céus de encanto

magia de outonos nas folhas caídas
calada ilusão
tronco secando ao relento

imagens quebradas
na noite dos tempos

Edinara Leão

Novos (velhos) tempos

Nuvens em janeiro?
- não!
Névoas em janeiro?
- sim!
E nos mecânicos sonhos
dos novos,
o cosmo se renova,
é verão
e o sol aquece,
clareia,
só não dilui
a escuridão
do coração,
não esvanece a dor
não faz nascer o amor
o amor
só sente a nostalgia
do paraíso
- in illo tempore -
e o desejo cru
de reintegrar-se
à criação
já não podendo...Ser!

Edinara Leão

Enquanto a cidade dorme

Enquanto a cidade dorme
rememoro
enxovalhados pensamentos
olho o asfalto e as luzes,
mas não vejo nada
- tudo que vejo é nada -
um coletivo
duas ou três pessoas
um cachorro,
idas e voltas

a cidade dorme
e não posso adormecer também

Edinara Leão

sono

I

não havia esteira
no eco do sonho
não havia esteira
e a vida dormia
dormia

II

um dia acordou cansada,
bruxas haviam rondado
sua noite
o sono fugia-lhe
pelos vãos do escuro
– não havia luar

III

noite adentro
perambulou sem fé
cactos lânguidos
jogavam a sorte
nos espinhos
é hora de cair as
cortinas
– talvez acordar.

Edinara Leão