Ecos do silêncio
solos de guitarra flamenca
morrem no ar
sementes regadas a rum
germinam no solo
do lado de cá do espelho
a bela adormecida
embebeda-se de sonhos
e dedilha alucinadamente
o fio da navalha
Euza Noronha é Professora e consultora cooperativista, tem participação em diversas antologias literárias, reside em Lavras/MG.
Ânua
escoltado por abelhas africanas
o ano se despede
das intenções melíferas ficam:
- uma pedra no caminho
- um poema inacabado
- um barco furado
- um presente no escuro
e todos os sonhos de navegantes à deriva
pergunto aos jornais
sobre esperança
respondem-me com serena insensibilidade
a pedra no telhado de vidro,
a revolta das vísceras,
o enjôo dos dias,
a imparcialidade do relógio
em bocas de lixo e beijos na boca
mas insisto em ver
com os olhos dos sonhos
haverá novas horas
de um mesmo relógio
que à maneira dos esperançados
beijará o primeiro segundo
soletrando estrelas de um dia primeiro
e apesar das incontáveis picadas
da mordaz e histriônica colméia
reinventaremos o mel
Euza Noronha
o ano se despede
das intenções melíferas ficam:
- uma pedra no caminho
- um poema inacabado
- um barco furado
- um presente no escuro
e todos os sonhos de navegantes à deriva
pergunto aos jornais
sobre esperança
respondem-me com serena insensibilidade
a pedra no telhado de vidro,
a revolta das vísceras,
o enjôo dos dias,
a imparcialidade do relógio
em bocas de lixo e beijos na boca
mas insisto em ver
com os olhos dos sonhos
haverá novas horas
de um mesmo relógio
que à maneira dos esperançados
beijará o primeiro segundo
soletrando estrelas de um dia primeiro
e apesar das incontáveis picadas
da mordaz e histriônica colméia
reinventaremos o mel
Euza Noronha
desejos III
numa margem
flor pubescente
noutra margem
haste chamejante
no meio
a ponte (suspensa) do desejo
(quando a travessia florescerá
este mosaico de vazios?)
Euza Noronha
flor pubescente
noutra margem
haste chamejante
no meio
a ponte (suspensa) do desejo
(quando a travessia florescerá
este mosaico de vazios?)
Euza Noronha
Espelhos
de um lado:
a boca
-sacra-
abrindo-se em agudo carnal
de outro lado:
as pernas
-prostitutas-
esperando em noventa graus
de cima:
o corpo
-pagão-
irrompendo desejos ciganos
de frente:
os olhos
-diabéticos-
sonhando lágrimas de mel
(quatro reflexos
numa taça de vinho:
hora de beber o amor)
Euza Noronha
a boca
-sacra-
abrindo-se em agudo carnal
de outro lado:
as pernas
-prostitutas-
esperando em noventa graus
de cima:
o corpo
-pagão-
irrompendo desejos ciganos
de frente:
os olhos
-diabéticos-
sonhando lágrimas de mel
(quatro reflexos
numa taça de vinho:
hora de beber o amor)
Euza Noronha
um quase bucolismo
laranjeiras
goiabeiras
mangueiras
e passarinhos
em onomatopéia outonal
frutas no chão
adubando vaidades
nos olhos compridos
do garoto
o catecismo:
a terra é de deus
em algaravia de zumbidos
a cerca vai desmentindo:
é
do
diabo
do
dono
Euza Noronha
goiabeiras
mangueiras
e passarinhos
em onomatopéia outonal
frutas no chão
adubando vaidades
nos olhos compridos
do garoto
o catecismo:
a terra é de deus
em algaravia de zumbidos
a cerca vai desmentindo:
é
do
diabo
do
dono
Euza Noronha
pas de deux
na dança das nuvens
te recebo galáctico
navegando minha boca
como se fossem eternos
nossos beijos elétricos
na dança do desejo
te recebo fálico
avermelhando meus sinais
como se fosse cálice
bêbado do teu vinho
e ao som de blues
embriagamos amor
eletrizando nossa taça
Euza Noronha
te recebo galáctico
navegando minha boca
como se fossem eternos
nossos beijos elétricos
na dança do desejo
te recebo fálico
avermelhando meus sinais
como se fosse cálice
bêbado do teu vinho
e ao som de blues
embriagamos amor
eletrizando nossa taça
Euza Noronha
fuga
pedem para eu ir
quero voltar
ou nem isso
quero fugir das amarras de onipresença
e embarcar olhos na polissemia da língua
enrabichar coração numa laçada sem nó
e embrulhar a vontade num rio de preguiça
só não quero ter
que ir
que vir
que ser
Euza Noronha
quero voltar
ou nem isso
quero fugir das amarras de onipresença
e embarcar olhos na polissemia da língua
enrabichar coração numa laçada sem nó
e embrulhar a vontade num rio de preguiça
só não quero ter
que ir
que vir
que ser
Euza Noronha
presença
não sei se vem da tela
ou se apenas nasce em mim
sei que o dia me azuleja
sei que a noite me enlua
sei que a aurora me acende
quando sinto teus vermelhos
brotando na minha rua
Euza Noronha
ou se apenas nasce em mim
sei que o dia me azuleja
sei que a noite me enlua
sei que a aurora me acende
quando sinto teus vermelhos
brotando na minha rua
Euza Noronha
Lua cheia em dois atos
no sertão
a sede emudece a voz
e a lua ilumina a peste
espreitando o golpe final
na rua
a lua brilha matreira
em pupilas dilatadas
pela lâmina do punhal
Euza Noronha
a sede emudece a voz
e a lua ilumina a peste
espreitando o golpe final
na rua
a lua brilha matreira
em pupilas dilatadas
pela lâmina do punhal
Euza Noronha
Deserto
face mergulhada
em correntezas do passado
abro frestas na memória:
mil e uma tempestades
dos hormônios adolescentes
sonharam no corpo
as areias do deserto
e seu Sheik de Agadir
das lembranças
emerge o tempo e sua razão:
só sente a aridez
quem nunca se fez oásis
Euza Noronha
em correntezas do passado
abro frestas na memória:
mil e uma tempestades
dos hormônios adolescentes
sonharam no corpo
as areias do deserto
e seu Sheik de Agadir
das lembranças
emerge o tempo e sua razão:
só sente a aridez
quem nunca se fez oásis
Euza Noronha
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